A racionalidade da fé salvífica – Mt 8.16-27

A relação de amor entre Cristo e o cristão – Ct 2.2-3
Novembro 19, 2016
A diferença entre o religioso e o salvo – Sl 11.1-7
Dezembro 3, 2016

Queridos, no que consiste a fé? A essência da fé é o conhecimento de Deus, da sua aliança eterna, da nossa inclusão na aliança, do seu plano eterno consumado em Cristo Jesus para salvação dos eleitos, das boas obras que ele preparou de antemão para que andemos nelas, pela abnegação, pelo sacrifício em obediência, como agentes de Deus para consecução do seu plano eterno. Nisto consiste a fé salvífica, no pleno conhecimento de Deus, e de Jesus Cristo, nosso Senhor (Jo 17.3).

Como podemos ver no trecho lido, as experiências não transmitem a fé salvífica, assim como a fé verdadeira precisa ser exercitada para não dar lugar à incredulidade.

Lemos os dois primeiros versículos (16 e 17) apenas para mostrar o contexto. Jesus fez vários milagres, e algumas pessoas, impressionadas com aquela experiência, com o que presenciaram, ofereceram-se para segui-lo. Aparentemente, estava tudo certo. Aquelas pessoas haviam se convertido por causa das experiências. Até mesmo um escriba, pertencente a uma das classes religiosas que faziam oposição a Jesus, aparentemente se converteu. Vejam a fé abstrata advinda da experiência (v.19).

Porém, como Jesus sabia que aquele homem não tinha conhecimento suficiente para tomar a decisão de segui-lo, deu-lhe uma informação radical para que ele soubesse as implicações da sua decisão (v.20). O homem precisava saber os prós e os contra da sua decisão, e o Senhor Jesus foi honesto com ele. É assim que pregam nos púlpitos hoje?

Pela sua graça, o Senhor nos oferece mais um exemplo (v.21). Outro dos que o seguiam naquele momento, também impressionado com as experiências, até queria seguir o Mestre, mas tinha responsabilidades familiares legítimas, e queria antes desincumbir-se delas. O Senhor Jesus nos mostra que este também não conhecia as implicações da sua decisão (v.22). Jesus mostrou-lhe que segui-lo exigia sacrifícios como ele não imaginava.

Irmãos queridos, aquele que tiver alguma dúvida de que as igrejas estão cheias de gente como estes dois falsos discípulos, provavelmente é um deles. E porque as igrejas estão cheias desse tipo de discípulos? Por que eles não receberam a fé salvífica, que é fundamentada racionalmente no conhecimento de Deus, mas apenas uma fé abstrata, emocional e supersticiosa. Segundo o próprio Deus, é isso que eles querem. A fé verdadeira exige sacrifício, renúncia, e os falsos discípulos só querem as bênçãos.

Estas duas respostas do Senhor Jesus aos seus pretensos discípulos deveriam ser consideradas por todos aqueles que se julgam crentes. O grave problema que enfrentamos hoje é que a maioria das pessoas que se agregam a uma organização sociorreligiosa chamada de igreja, não é advertida claramente, como o Senhor Jesus fez, a calcular o preço, a considerar as implicações da sua decisão. Quantos sabem ao menos o significado destas respostas de Jesus?

Em sua essência, estas respostas têm o mesmo significado do negar-se a si mesmo a cada dia, tomar a sua cruz e seguir o Mestre (Mt 16.24). Estas repostas de Jesus nos ensinam claramente, que há ocasiões em que temos que abrir mão de tudo por amor a ele, até mesmo de obrigações familiares importantes e legítimas, como a daquele pretenso discípulo que antes queria sepultar o pai. Convém chamar atenção para o fato de que outras pessoas poderiam fazer aquilo em seu lugar, mas seguir o Mestre, esta era uma decisão pessoal, na qual ele não poderia ser substituído por ninguém.

E nós? Quantas vezes deixamos de seguir o Mestre, por exemplo, faltando à Escola Bíblica, aos cultos de doutrina, à comunhão dos santos, por causa de compromissos familiares que são legítimos? Será que ao menos consideramos que poderíamos ser substituídos por outras pessoas, ou até mesmo adiar os compromissos para não perder o ensino do Mestre, conscientes de que ninguém pode aprender em nosso lugar? Será que consideramos os ensinos do Mestre como vitais, indispensáveis às nossas decisões?

Irmãos, quando meditamos honestamente nestas coisas, não há como não concluir que a fé professada por muitos não é racional, mas puramente cultural, abstrata, simples ideia sem obras, emocional e supersticiosa, uma vez que está desprovida do conhecimento necessário para considerar as implicações da decisão de seguir o Mestre. Estas respostas de Jesus nos ensinam que não basta o pretenso discípulo “levantar a mão” e dizer que o aceita como seu Salvador, como normalmente acontece nas igrejas. Estas respostas de Jesus nos ensinam que não é qualquer voluntário, alguém que deseja segui-lo apenas por causa de alguma experiência, que serve para ser seu discípulo.

É comum estas pessoas passarem a contar a tal experiência recheada de invenções, qualificando-a como testemunho da sua conversão, usurpando a glória devida a Deus. Percebe-se claramente que tais pessoas apresentam falsas expectativas acerca da salvação, em função da falta de conhecimento de Deus, que é a essência da fé salvífica.

É por isso que nos esforçamos para ensinar, para pregar honestamente como os profetas do Velho Testamento, como Jesus e os apóstolos pregaram, embora saibamos pelas Escrituras, e pela própria experiência, que isso não agrada aos ouvintes.

Na continuação dos versículos que lemos, vejam que coisa interessante. Vejam como nós dependemos de Deus. Mesmo a fé verdadeira depende da graça de Deus, e precisa ser exercitada racionalmente para que a incredulidade não venha a comprometê-la.

No contexto, Jesus e os discípulos atravessavam o mar da Galileia em um barco, quando foram apanhados por uma tempestade. Aqui, de passagem, lembramos que, contrariamente aos ensinamentos mais frequentes nos púlpitos, o fato de estar com Jesus não anula a possibilidade de virem tempestades sobre nossas vidas.

Continuando o relato, vimos que o Senhor Jesus dormia, enquanto os discípulos, em desespero, o acordaram clamando por salvação. O Senhor acudiu, porém, não sem antes passar-lhes uma repreensão: porque sois tímidos, homens de pequena fé? (v.26). Percebem, irmãos? Diferentemente daqueles dois candidatos a discípulos, estes realmente deixaram tudo para seguir o Mestre, e, no entanto, ainda não o conheciam suficientemente (v.27). Como eu tenho dito, a essência da fé é o conhecimento de Deus e a prática obediente e racional desse conhecimento, independentemente das circunstâncias.

Quantos de nós, na iminência da morte por causa da fidelidade ao Senhor, podem dizer como Jó, ainda que ele me mate, nele esperarei (Jó 13.15)? Como podemos constatar neste episódio, os próprios discípulos de Jesus ainda não tinham esse conhecimento. Assim como Jó consolidou o seu conhecimento de Deus pelo sofrimento, a ponto de afirmar: eu te conhecia só de ouvir, mas agora os meus olhos te veem (Jó 42.5), os discípulos também precisaram enfrentar a tempestade para clamar ao Senhor, depender do seu poder e da sua graça, o que lhes aumentou a fé, pelo conhecimento racional daquele que não os livrou da tempestade, para livrá-los na tempestade.

Irmãos, prestem bem atenção! Como vimos nestes versículos lidos, para seguir o Mestre, nós temos que fazê-lo conscientes das dificuldades que enfrentaremos. Na sequência também pudemos ver que, mesmo quando recebemos a fé verdadeira para seguir o Mestre, no início da caminha ela ainda não é forte o suficiente, porque ainda estamos aprendendo a conhecê-lo. Esta é a importância vital do discipulado, e os discípulos verdadeiros perseverarão na busca desse conhecimento.

Também vimos que o método de ensino do Mestre contempla  as dificuldades, aflições, tribulações, provações, exatamente para que confiemos nele e nos mantenhamos humildes e dependentes do seu poder e da sua graça, na medida em que crescemos cada vez mais no conhecimento da sua vontade. Esta é a essência da fé racional, aquela que, pela prática, pela perseverança fica cada vez mais robusta, a ponto de dizermos como Paulo, eu sei em quem tenho crido, e estou certo que ele é poderoso para guardar o meu depósito até aquele dia (2Tm 1.12).

Que Deus nos abençoe com a fixação e prática deste ensinamento, para que não tenhamos dúvida sobre quem é este que até os ventos e o mar lhe obedecem (v.22). É Jesus, o nosso Criador, o nosso Redentor, o nosso Salvador, o nosso Senhor, e que este conhecimento seja uma realidade evidenciada naturalmente em nossas vidas de santidade, em obediência, para louvor da glória do nosso Deus. Amém.